O engenheiro de obras e os pepinos

O engenheiro de obras tem um diferencial diante dos outros engenheiros. Ele acompanha na prática o desenvolvimento da construção, a cada passo ele está presente para perceber a diferença entre o que foi previsto ou projetado e a realidade. É um “solucionador de problemas”. Ele enfrenta muitas situações que devem ser resolvidas com inteligência e agilidade. Mas a grande dificuldade muitas vezes não reside em executar tudo no prazo ou controlar a qualidade do concreto. O engenheiro deve ter habilidade para trabalhar com diversos tipos de pessoas que possam vir a trabalhar em sua obra.

Durante a construção de um teatro, eu como engenheiro visitava a obra todos os dias, afinal em uma obra deste porte a fiscalização do processo de construção deveria ser intenso. Cheio de problemas para resolver, um dia o mestre-de-obras Antônio Carvalho me interrompeu para fazer a seguinte petição:

- Doutor, o servente novo que o senhor contratou, o Pedro Mineiro, é muito bom no que faz. Aprende tudo que eu falo pra ele com a maior facilidade. Pode subir ele pra meio-oficial que ele dá conta.

Então eu disse:

- Tá certo, Antônio. Amanhã pela manhã resolvo isso.

Preocupado com outras coisas, esqueci de subir o Mineiro de cargo. Antônio percebeu e logo foi me cobrar:

- O Mineiro, doutor, não esquece de subir o salário dele que ele já tá trabalhando de meio-oficial.

Então ao setor de tesouraria e o subi de cargo.

Depois de três meses, Antônio voltou a me falar do Mineiro:

- Sr. Gustavo, o Mineiro tá indo muito bem como meio-oficial, mas ele já ta bom pra virar pedreiro de acabamento, nós estamos precisando dele pro acabamento.

- Tá bom, Antônio. Agora eu tenho muita coisa pra resolver. Amanhã eu o promovo.

Novamente me esqueci de promover o bendito do Mineiro. Mas Antônio no dia seguinte já veio me novamente:

- Doutor, como tava sem gente no acabamento o já mandei o Mineiro pra lá. Então o senhor não esquece não de promover ele na tesouraria.

- Tá certo, Antônio. Ontem eu me esqueci porque o cano vazou lá no banheiro e eu tive que ir ver como ia fazer pra arrumar.

Não se passaram dois meses e o Antônio voltou ao meu escritório:

- Viu Sr. Gustavo, bom dia. Eu vim aqui pra falar eu to precisando do Mineiro como azulejista.

- Antônio, o Pedro tá trabalhando com a gente só faz um ano. Não acha que ele é muito novo pra trabalhar de azulejista?

- Ele tá novo sim, doutor, mas o menino é bom, aprende muito rápido.

Então no dia seguinte eu fui à tesouraria novamente e promovi o Mineiro.

Quando o prédio estava quase pronto, fui à obra para verificar como estava o andamento do acabamento. Olhei para todos os pedreiros e serventes na ala principal, cada um estava desempenhando sua função. Mas quando fui ao banheiro do teatro o mineiro, que deveria estar lá, não estava. Andei por toda a obra e não o encontrei.

Chamei Antônio e disse:

- Antônio, onde está o Mineiro? Andei pela obra intera e não o encontrei.

- Olha, doutor, o Mineiro não está mais trabalhando direito. Falta sem dar satisfação, quando chamo a atenção dele ele responde, faz serviço malfeito...

- Mas como ele faz isso depois de ter subido tanto de cargo? Você não disse mais nada pra ele? Olha Antônio, você tinha que ter feito alguma coisa!

- Tá doutor, eu tentei, mas o rapaz não me respeita mais. Fiquei com medo de falar pro senhor porque insisti tanto pra promover ele e no fim acontece isso.

- Amanhã eu falo com ele Antônio, pode ficar sossegado.

No dia seguinte, Pedro foi trabalhar, e eu fui logo ao seu encontro para conversar.

Quando cheguei perto dele os outros pedreiros me parece que já sentiram o cheiro de confusão e saíram de perto. Só ficaram no local o Mineiro, Antônio e eu. Então eu disse:

- Pedro, o que tá acontecendo que você andou desobedecendo a seu chefe?

- Gustavo, eu não concordo com o jeito que ele trabalha. Simplesmente não admito mais obedecer a ordens vindas dele.

Eu me vi em uma situação difícil. Mineiro estava revoltado mesmo. Mas expliquei pra ele:

- É o seguinte Mineiro. Você chegou aqui como servente, ganhando um salário mínimo. Pois o Antônio foi à minha sala e pediu pra te promover a meio-oficial. Eu, cheio de coisas pra resolver, esqueci. Mas Antônio foi e me lembrou. Depois de três meses ele voltou lá, te elogiou, e me pediu pra te promover a pedreiro de acabamento. Também esqueci, mas no dia seguinte Antônio novamente se lembrou de você. Da mesma maneira aconteceu até você virar azulejista.

Como os dois ficaram em silencio, continuei falando:

- Você não é bobo e já deve ter percebido que se você hoje está ganhando três vezes mais do que quando chegou foi porque o Antônio ficou no meu pé pra eu te promover.

Então eu mudei um pouco o tom de voz e falei com firmeza:

- Pra falar a verdade, Mineiro, eu já perdi muito tempo com você, tenho muita coisa pra fazer. Vocês que se resolvam aí.

E então saí do local. Creio que o Mineiro não veio a causar mais problemas para o Antônio.

Essa é uma situação de várias que já passei apertado com funcionários. Eu poderia ter mandado o Mineiro embora, mas desta maneira iria perder meu melhor azulejista. O que todos os engenheiros precisam entender é que problemas devem ser resolvidos com sabedoria, em todas as situações.

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